Publicado em: O Gaiense, 9 de Outubro de 2010
Os portugueses que trabalham nas instituições europeias comemoraram, de diferentes formas, o centenário do 5 de Outubro e lembraram os valores republicanos.
Há certos momentos em que temos que suspender aquele nosso jeito tão especial de dizermos mal de nós próprios, comparando-nos com o que se passa “lá fora”. Há matérias relativamente às quais não encontramos, por essa Europa fora, quem nos possa servir de termo de comparação para alimentar o nosso vício nacional de autoflagelo. A questão da República é uma delas. Em 1910, Portugal, país atrasado e analfabeto, dava uma lição à Europa moderna e desenvolvida (como já tinha feito, no século XIX, com a pioneira abolição da pena de morte). Os valores e os princípios que o país assumiu há um século eram tão avançados que, ainda hoje, muitos dos nossos parceiros europeus lhes ficam bastante atrás.
Um aspecto é, obviamente, a impossibilidade de uma família se arrogar o direito de assumir a chefia do Estado e de a transmitir por herança de geração em geração, sem que os súbditos tenham qualquer voto na matéria. Esta anacrónica aberração de tratar cidadãos como súbditos de qualquer majestade continua a vigorar em muitos países que já conseguiram abolir os privilégios de casta no acesso aos restantes cargos da administração pública, mas que tardam em completar a democratização da sua estrutura de Estado.
Outro aspecto é a secularização do Estado, condição fundamental para o respeito pela liberdade de todas as religiões e pela liberdade de não ter religião nenhuma. Em muitos países europeus continua a haver uma religião de Estado e até, em alguns casos, uma Igreja de Estado, mesmo em países onde apenas uma minoria da população acredita em deus, segundo os últimos inquéritos.
Talvez a nossa forma republicana fosse mais avançada porque resultou de uma revolução, assim como a nossa Constituição, as nossas leis eleitorais ou até mesmo o pluralismo na nossa comunicação social sejam hoje dos mais avançados da Europa, porque são todos filhos de uma outra revolução. Têm sido as revoluções que têm colocado Portugal na linha da frente. Há cem anos, há trinta e seis e, talvez no futuro. Nesta matéria, não há comparação europeia que nos deva deixar deprimidos.
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