Publicado em: O Gaiense
É o fado. Nós temos e o Brasil não tem. Sendo esta uma crónica política e não musical, refiro-me, pois, ao fado na política portuguesa. Em semana de debate do Orçamento de Estado, a grande justificação das medidas que vamos sofrer em 2011 foi que será assim porque tem que ser assim, é uma fatalidade a que não podemos fugir; não há alternativa, é o nosso fado. O problema é que o povo, que em sondagem afirma a sua discordância com as medidas propostas, mostra também que se conforma com os sacrifícios, porque tem que ser. É o espírito do fado a guiar as opções políticas das vítimas do Orçamento, dispondo-as a sofrê-lo com resignação.
Ao mesmo tempo, do outro lado do Atlântico, o fado da resignação perdeu mais uma batalha. Os nossos irmãos, mais dados ao samba, elegeram a nova Presidente Dilma Rousseff. A mulher que disse, no congresso em que foi designada candidata, que “o Brasil avançou tanto nos últimos anos porque soubemos construir novos caminhos, derrubando velhos dogmas. Provamos que distribuindo renda é que se cresce. E se cresce de forma mais rápida e sustentável. Essa distribuição de renda permitiu construir um grande mercado de bens de consumo popular. Ele nos protegeu dos efeitos da crise mundial. Criámos 12 milhões de empregos formais. A renda dos trabalhadores aumentou. O salário mínimo real cresceu como nunca. Estamos construindo um Brasil para todos.”
Para os fatalistas portugueses, este seria o caminho da ruína e da dívida sem fim. Dilma mostra o contrário: “Reduzimos a dívida em relação ao PIB. Hoje não pedimos dinheiro emprestado ao FMI. É o Fundo que nos pede dinheiro.” “Alguns ideólogos chegavam a dizer que quase tudo seria resolvido pelo mercado. O resultado foi desastroso. Aqui, o desastre só não foi maior - como em outros países - porque os brasileiros resistiram e conseguiram impedir a privatização da Petrobrás, do Banco do Brasil, da Caixa Econômica...”
Ninguém pode hoje negar o sucesso económico que resultou das opções políticas dos brasileiros. E os portugueses não precisam de tradução para perceberem o que por lá se passa. Todo o leque de opções políticas de que o Brasil dispõe estão também disponíveis em Portugal, como na generalidade dos países, que a política também se globalizou. O que falta é um povo que saiba apreciar o fado como estilo musical, mas que não faça dele uma estranha forma de vida política, onde a resignação abafa a coragem de construir novos caminhos e derrubar velhos dogmas, como diz a nova presidente.
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