O emprego na campanha da Irlanda





Publicado em: O Gaiense, 10 de Outubro de 2009
Os irlandeses lá foram obrigados a votar uma segunda vez porque, da primeira, teriam votado mal. Aqui está uma originalidade da democracia europeia: o resultado certo é definido antecipadamente. Se os eleitores se enganarem, repetem até acertarem, como um aluno que vai a exame e, se errar, chumba e repete na próxima época. Os alunos, é claro, não são soberanos nas suas respostas. Os irlandeses, pelos vistos, também não. Mas, pelo menos, tiveram direito a ir a exame, sorte que não nos bafejou.
O perfil das entidades participantes na campanha pode também causar-nos alguma estranheza. Publicados os orçamentos da campanha, aparecem-nos do lado do SIM os principais partidos (Fianna Fail €500 000, Fine Gael €300 000, Labour €200 000, Green Party €13 000), mas também Ryanair €500 000, Intel €300 000...
A Ryanair (a companhia aérea que não aceita trabalhadores sindicalizados), activo “partido” do lado do SIM, fez a campanha levando consigo Antonio Tajani, Vice-Presidente da Comissão Europeia e responsável pela supervisão dos transportes na UE. Numa democracia normal, este “convívio” não seria possível. Mas Tajani tem outros hábitos: fundador da Forza Italia, foi porta-voz de Berlusconi. Tudo se pode esperar, portanto.
O grande argumento da campanha foi que só o SIM defenderia o emprego. O presidente da Câmara de Comércio Americano, que se apresenta como “representante dos interesses das multinationais americanas na Irlanda”, fez uma forte campanha dizendo que este era o voto pelo emprego. Curioso é que, apenas terminados os votos, a companhia aérea AerLingus tenha anunciado o despedimento de 676 trabalhadores para redução de custos, apesar de os seus passageiros terem aumentado 4,1% no último ano. A Intel Irlanda, que também fez campanha própria como se fosse uma organização política, decidiu esta semana despedir 295 empregados. Acabada a campanha e ganho o voto condicionado pelo medo do desemprego, vem a dura realidade do desemprego, que tinha sido adiado com medo do voto. 

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