Uma gigantesca transferência de fundos




Publicado em: O Gaiense, 29 de Maio de 2010
Sob ataque dos especuladores financeiros nacionais e internacionais, o governo resolveu endurecer as condições de vida dos portugueses através do aumento dos impostos, restrições nos salários e nas prestações sociais, aperto nos serviços públicos essencias, venda de parte do nosso património comum. Com isso vai arrecadar muitos milhões. Para quê? Para pagar aos especuladores que investem na dívida pública do nosso país e que conseguiram, com a ajuda preciosa das agências de rating, aumentar as taxas de juro que Portugal paga pelos empréstimos que vai contraindo.
É importante que cada um saiba que o dinheiro que agora lhe vai faltar ainda mais ao fim do mês vai seguir direitinho para o bolso de gente muito pouco recomendável. Fazer sacrifícios em tempos difíceis, para ajudar um familiar, um amigo em dificuldade ou até a comunidade, é uma atitude que só enobrece quem a toma. Obrigar o povo a fazer sacrifícios para alimentar tubarões sem escrúpulos, multimilionários que se aproveitam das circunstâncias difíceis para acrescentar uns zeros aos montantes estratosféricos das suas contas-correntes, é uma opção que de nobre nada tem.
O Banco Central Europeu tem financiado a 1% bancos privados que depois emprestam esse mesmo dinheiro aos Estados a juros quatro, cinco ou seis vezes superiores. É para pagar esse diferencial absurdo que vai servir o fruto do nosso sacrifício.
Os portugueses (pessoas individuais e colectivas) que têm as suas poupanças em depósitos a prazo, recebem dos bancos um juro irrisório. Muito menos do que o juro que o Estado português paga quando se vai financiar no mercado. Não será óbvio que esses depositantes prefeririam investir as suas poupanças em títulos emitidos pelo Estado, que lhes poderia pagar um juro superior ao que lhes dá a banca, e ainda assim inferior àquele a que o Estado obtém os seus empréstimos? O Estado pagava menos pelo dinheiro de que necessita, os aforradores nacionais recebiam mais, a dependência externa era reduzida. Todos ganhavam com esta relação directa entre a economia do Estado e as economias dos seus cidadãos.
Todos? Não. O sector financeiro, que paga pouco e cobra muito, esse via desaparecer uma fatia substancial do seu negócio. Talvez por isso uma solução de mero bom-senso custe tanto a ser implementada.

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