Num processo
de privatizações há vendedor (o Estado ou outra entidade pública) e compradores
(os grupos privados, bancos privados, fundos de investimento, etc.). O
primeiro-ministro convidou para tomar conta das privatizações, para fazer o
papel de vendedor, o mais reputado e competente representante dos compradores:
António Borges.
Talvez porque o primeiro-ministro sabe, ou tem fé, que só mesmo o
coração piegas dos portugueses se poderia enternecer com a candura franciscana
desta cena que encarrega o irmão lobo de transportar os irmãos cordeiros para a
feira.
Mas agora, com o convite de um dos maiores grupos privados portugueses
(com sede na portuguesíssima rua Naritaweg, Amsterdam - Nederland) para que António
Borges integre o Conselho de Administração da Jerónimo Martins, este generoso
espírito de partilha público-privado atinge todo o seu esplendor.
Crónica publicada em: O
Gaiense, 17 de Março de 2012
A Comissão Europeia deu luz verde para a entrada na administração da
entidade reguladora do sector alimentar – Autoridade Europeia para a Segurança
dos Alimentos (EFSA) – da presidente do FoodDrinkEurope, o lobby empresarial do
sector que aquela autoridade é suposta controlar. A EFSA tem como missão avaliar
a segurança dos produtos que são postos no mercado, das substâncias que contêm,
as alegações nutricionais e de saúde e deve assegurar a comunicação pública
transparente sobre os riscos associados aos produtos alimentares.
Numa mesma linha, mas em sentido contrário, o todo poderoso Comissário Europeu
da Indústria da primeira Comissão Barroso, Günther Verheugen, e a sua chefe de
gabinete Petra Erler fundaram uma empresa de lobby, cinicamente chamada “The
European Experience Company”.
Neste saudável contexto europeu de partilha e de íntima convivência entre
interesses privados e cargos públicos, por que razão António Borges, que o
primeiro-ministro contratou para liderar a equipa que vai supervisionar as
privatizações e as renegociações das parcerias público-privadas, não haveria de
aceitar também o convite para integrar o Conselho de Administração da Jerónimo
Martins que lhe foi dirigido por uma tal Sociedade Francisco Manuel dos Santos
com sede em Amsterdão?
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