Publicado em: O Gaiense, 24 de Março de 2012
Começou a primavera, mas ainda não foi para todos.
No domingo fui à capital do Curdistão turco, a antiga cidade de Amed - que os
turcos chamam Diyarbakir -, nas margens do rio Tigre, perto das conturbadas
fronteiras com o Iraque e a Síria, para assistir à celebração do Newroz
(literalmente: novos dias), uma grande festa de tradição multimilenar em vários
países da Ásia, que celebra o fim do inverno e a chegada da primavera.
Quando cheguei informaram-me que
a administração turca tinha proibido a comemoração. Talvez porque há várias
décadas que os curdos manifestem nesta passagem do inverno para a primavera a
expressão do seu desejo de passar dos difíceis dias de opressão política e
cultural em que vivem para uma verdadeira primavera de liberdade e democracia.
O Parque Newroz, para onde estava prevista a concentração, foi bloqueado por um
apetrechadíssimo aparato policial e foram cortadas todas as ruas de acesso. Na
véspera já tinham confiscado a aparelhagem sonora instalada no palco.
Mas nem esta poderosa força de
bloqueio foi capaz de suster a avalanche de famílias que fizeram questão de
manter a sua tradicional comemoração. Homens, crianças e mulheres, envergando
os seus trajes de festa plenos de brilho e de cor, ultrapassaram todas as barreiras
policiais e juntaram-se no parque. Um milhão de pessoas - dizem várias
estimativas. Foi uma impressionante manifestação de coragem e determinação,
como não via há muito tempo. Uma luminosa demonstração de que nem toda a
violência da repressão poderá parar a marcha da primavera curda.
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