Publicado em: O Gaiense, 10 de Novembro de 2012
Imaginemos um homem que tem 50 mil euros e uma paixão por automóveis. Decidido a gastar aquele dinheiro na máquina dos seus sonhos, sabe que a mulher tem uma doença grave e que para salvar-se tem de submeter-se a um tratamento que custa 50 mil euros. Se o homem lhe disser que não tem dinheiro para a salvar, está a mentir ou a falar verdade? Se não fosse possível de todo falhar a compra do carro, então seria verdade que não tem dinheiro para salvar a mulher. Mentiu apenas porque fez uma opção: primeiro o carro, depois a mulher.
Quando governantes e comentadores nos dizem insistentemente que não há dinheiro para as funções sociais do Estado, estão a fazer o mesmo. Porque o dinheiro existe, as receitas do Estado são mais do que suficientes, só que os governantes já decidiram entregá-las aos mercados financeiros que cobram juros exorbitantes pelo nosso “resgate”. O que nos estão a dizer é que, depois disso, já não sobra para o Estado social. Mentem quando dizem que não há dinheiro, mas mentem porque fizeram uma opção: os pagamentos à banca não se discutem, o Estado social, esse, refunda-se e adapta-se à dimensão exígua das sobras.
A França e a Bélgica vão injectar mais 5 500 milhões de euros para salvar o banco Dexia, que já tinha recebido 6 400 milhões em 2008. Depois virão dizer que reformas e pensões, ordenados e serviços públicos são insustentáveis e não podem continuar.
Todos eles mentem, mas mentem porque fizeram uma opção. Tratemos nós também de fazer a nossa opção. Digamos: insustentável é o juro do resgate. Diga-se à troika: é preciso cortar nos vossos juros e impor austeridade aos vossos créditos. Podemos até utilizar a sua expressão favorita: nós nem queríamos fazer estes cortes, mas não há alternativa...
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