Publicado em: O Gaiense, 13 de Agosto de 2011
Ninguém terá ficado indiferente às notícias sobre os tumultos em Inglaterra. Não se trata de mais uma manifestação da crise do euro, que a libra ainda é a moeda corrente do lado de lá da Mancha. Mas, se a moeda é diferente, a crise é a mesma. E as receitas adoptadas para tentar fazer-lhe frente também: cortes nas despesas sociais, austeridade e mais austeridade. O poder económico e o poder político (o mesmo é dizer os ricos e os poderosos) estão a impor medidas drásticas sobre uma população que não se vê como responsável pelos problemas criados, nem compreende por que razão os responsáveis pela crise continuam a acumular riqueza em tempos ditos de dificuldades e sacrifícios para todos. Há múltiplas sensações de injustiça que se vão acumulando gradualmente no coração normalmente pacato do trabalhador europeu. Que tem aguentado as agressões feitas à sua vida, ao sustento decente da sua família, em nome de uma vaga esperança na manutenção do pouco que resta do Estado social, resultado de um velho contrato que aguentou a Europa durante décadas.
O problema é que a política agressiva de austeridade para os de baixo constitui uma ruptura unilateral desse contrato por parte dos de cima, criando uma nova situação em que se está a matar toda a esperança numa vida melhor. Se os governos desta Europa do século XXI não oferecem nenhuma perspectiva real de progresso à sua população mais pobre, perdem a autoridade para exigir que esta se comporte segundo as regras de uma sociedade onde aparentemente não cabem, onde não são considerados parte da solução para a crise. A quem não fizer parte da solução, não lhe resta mais do que fazer parte do problema, para se fazer ouvir. Por vezes da pior maneira, é certo. Poderão estar a escrever a história por linhas tortas mas, mesmo assim, há que saber ler as angústias e os avisos que estão escritos na forma bruta dos incêndios e destruições.
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