Publicado em: O Gaiense, 13 de Março de 2010
O “não” obteve uma esmagadora maioria no referendo a que nos referimos na crónica anterior. Mais de 93% dos votos rejeitaram os termos do plano de pagamento ao Reino Unido e aos Países Baixos das perdas dos investidores no banco on-line Icesave.
“Às pessoas normais, agricultores e pescadores, aos contribuintes, médicos, enfermeiros, professores, é pedido que suportem com os seus impostos um fardo que é o resultado da acção de banqueiros irresponsáveis e gananciosos” – disse o Presidente da República quando recusou promulgar a deliberação do parlamento, obrigando à convocação do referendo.
Com este resultado, o povo da Islândia já ganhou uns milhões, porque provocou uma imediata revisão em baixa das exigências inglesas. As pressões destes especialistas em "ultimatuns" (como Portugal bem relembra neste centenário da República) tinham ultrapassado os limites da paciência dos islandeses quando, à falta de melhor, invocaram uma lei anti-terrorista para cativar todos os valores dos bancos da Islândia no seu território.
Os três bancos que colapsaram em 2008 tinham sido dos maiores beneficiários da política do anterior governo de direita e do seu plano de privatizações e liberalização da economia. As suas operações especulativas, hoje objecto de processos judiciais, atingiram uma dimensão dez vezes superior à da economia do país.
No entanto, o caso Icesave, objecto do referendo, pouco ultrapassa os 3 800 milhões de euros, um valor semelhante ao envolvido no "salvamento" do BPN em Portugal; é, pois, um valor irrelevante para grandes economias como a inglesa ou holandesa. Para estes dois Estados, trata-se mais de uma questão política do que de economia real. Porém, para a Islândia, que tem a mesma população que Vila Nova de Gaia, este montante corresponde a 12 000 euros por habitante e a 40% do PIB e a questão não é só de princípio político, mas de opção entre ter condições para recuperar da crise ou ficar estrangulado durante anos pelo pagamento, com juros elevados, das dívidas a quem apostou em investimentos especulativos com o banco errado no momento errado.