No Palácio do Planalto, com Lula, no último dia do seu mandato

No Palácio do Planalto, a última guarda para o Presidente que mudou o Brasil.



Lula, o primeiro presidente operário da história do Brasil, fala com a descontracção do último dia



Alguns assistentes junto ao magnífico painel de Burle Marx


No fim, os cumprimentos


Na foto com a equipe do Ministério do Desporto, as bolas de futebol não podiam faltar


Aqui terá funcionado um dos "segredos" de uma governação em que, 
segundo dados estatísticos oficiais, 
27,9 milhões superaram a pobreza e 35,7 milhões subiram de classe social.


Outro dos "segredos" do sucesso internacional do Brasil, 
um dos governantes que hoje cessa funções:
Celso Amorim, considerado pela revista Foreign Policy
o melhor Ministro dos Negócios Estrangeiros do mundo


Entretanto, no Palácio do Planalto, tudo está preparado
para a cerimónia de amanhã, a "Transmissão da Faixa Presidencial"
para a nova presidente Dilma Rousseff



Uma escultura junto aos elevadores

e um túnel de acesso entre edifícios do palácio

Daqui falará Dilma aos convidados e à multidão reunida na Praça dos Três Poderes



numa cidade que recebe de braços abertos a primeira mulher Presidente da República do Brasil.





A UE em “gestão corrente”


[ A divisa da Bélgica "A União faz a Força", no que respeita à adequação à realidade política do país, parece só encontrar rival na adequação da divisa "Liberdade, Igualdade, Fraternidade" à França de Sarkozy ]


Publicado em: O Gaiense, 25 de Dezembro de 2010

Acaba o ano de 2010 e chega ao fim o semestre em que a Bélgica exerceu a presidência rotativa do Conselho da União Europeia. O aspecto mais interessante e original desta presidência é que ela deveria ter sido exercida pelo governo belga mas, na realidade, a Bélgica vive sem governo há mais de seis meses. As eleições realizadas a 13 de Junho produziram uma composição parlamentar complexa, dando origem a um processo de negociações para a constituição do novo governo. Quando, a 1 de Julho, a Bélgica assumiu a presidência do Conselho da UE, estas negociações ainda estavam no seu início e um governo com meras funções de gestão corrente no seu país teve de assumir a tarefa de conduzir a governação da UE.
Chegamos ao fim de Dezembro e as negociações belgas ainda continuam a desenrolar-se, lentas e quezilentas, sem qualquer fim à vista. A Bélgica continua sem governo e a vida vai correndo num país que já começou a habituar-se a sobreviver a estes longos impasses. Alguns comentadores ironizam que a conservadora Bélgica se tornou no mais actual argumento das correntes anarquistas, demonstrando na prática que é possível um país desenvolvido viver sem governo e não entrar no caos. Outros invejam a sorte dos belgas, já que, nos restantes países da UE, os governos aplicam, um após outro, duros planos de austeridade, enquanto que sobre os belgas ainda não caiu esta desgraça porque não há governo para aprovar e aplicar essas drásticas medidas.
Se na Bélgica não há plano de acção governamental, como poderia haver um plano de acção para a presidência belga do Conselho? É verdade que neste país fundador da UE (e que se assume como a capital da UE) abundam os quadros técnicos, políticos e administrativos com profundo conhecimento e experiência das questões europeias. Foram eles que tiveram de dar conta do recado, com empenho e competência, mas sem alma nem projecto. Talvez por isso se tenham integrado tão bem no modo hoje dominante na União, um complexo gigante algo perdido num mundo em mudança, sem alma nem projecto, onde os grandes países preferem que os pequenos países que se sucedem na liderança do Conselho evitem ter a veleidade de pensar que dirigem seja o que for de substancial, limitando-se a funcionar como meras presidências de “gestão corrente”, como foi, por necessidade circunstancial, esta presidência exercida pelos belgas.

O que Wikileaks não disse, mas mostrou


[ O big brother está a ser vigiado e não gostou... ]


Publicado em: O Gaiense, 18 de Dezembro de 2010

A vida política internacional tem vivido nos últimos dias ao ritmo das revelações dos telegramas diplomáticos publicados no site Wikileaks sobre questões militares, políticas e da vida empresarial. E, no entanto, ainda só se conhece menos de 1% do material em stock, que continua desesperantemente (para alguns) a pingar na internet e na redacção dos jornais. Se é verdade que não há democracia sem transparência, estamos então perante um inestimável serviço público que permite aos governados saberem um pouco mais sobre o que fazem e dizem aqueles que governam em seu nome.
Mas, talvez tão importante como o que é dito nos telegramas, seja aquilo que a operação Wikileaks veio mostrar.
Mostrou que o mais esmagador e tecnológico poder de toda a história da humanidade, os EUA e a sua máquina de guerra e de controlo do mundo, de espionagem e de contra-espionagem, se revelaram completamente impotentes para prevenir e posteriormente bloquear a acção de um pequeno grupo de jornalistas e activistas. Todos os ataques se mostraram infrutíferos, em resultado da multiplicação de apoios dos defensores do Wikileaks, que replicam o site por todo o mundo, tornando impossível o seu bloqueio. As reacções violentíssimas dos partidos e da Administração norte-americana são um sinal forte da importância das revelações, do embaraço causado pela sua publicação e sobretudo da sensação de impotência da grande potência. Ironia das ironias: o big brother está a ser vigiado e não gostou...
Mostrou ainda que as grandes empresas financeiras ou de vendas que baseiam na net os seus serviços estão disponíveis para bloquear um cliente a pedido do governo, sem qualquer decisão judicial.
E mostrou também que toda a retórica das potências ocidentais contra a China, Cuba, o Irão ou a Coreia sobre a importância da liberdade de expressão, de acesso e de publicação na internet de materiais incómodos para os governos, afinal é um mero instrumento de combate político e não uma real convicção em defesa da liberdade. Quem verdadeiramente defende a liberdade da internet naqueles países (como é o nosso caso), não pode deixar de condenar com veemência os ataques que estão em curso contra a mesma liberdade da internet no que é ironicamente designado por "mundo livre".

Os partidos europeus




Publicado em: O Gaiense, 11 de Dezembro de 2010
Realizou-se no passado fim-de-semana, em Paris, o 3º Congresso do partido da Esquerda Europeia. Foi um acontecimento com pouca visibilidade na comunicação social portuguesa, como frequentemente acontece com temas da política europeia. Temos o mau hábito de ignorarmos muitos dos debates políticos que, na Europa, vão definindo o nosso destino, enquanto damos demasiada atenção a pequenas tricas da política nacional sem consequências de maior. Acresce a este provincianismo mediático o facto de muitos dos nossos jornalistas nem sequer compreenderem muito bem o que é e para que serve um partido europeu.
É verdade que os partidos europeus, oficialmente reconhecidos, têm uma existência recente: foram criados a partir de 2004, quando entrou em vigor o regulamento relativo ao seu estatuto e financiamento. É também verdade que o seu papel está numa fase inicial de afirmação. Todos sabemos que um partido assume notoriedade pública mais evidente quando concorre às eleições e, até ao momento, as eleições europeias têm sido pouco mais do que uma soma de 27 eleições nacionais com campanhas onde pouco se discute a política europeia.
Tudo isso é verdade, mas é preciso observar em que sentido tem evoluído a vida política institucional da União, para poder perceber que alterações são expectáveis no curto prazo. E uma das alterações prováveis vai no sentido da europeização do debate político e das próprias eleições. Nos tratados anteriores, os eurodeputados eram definidos como “representantes dos povos dos Estados reunidos na Comunidade”. Já foi um progresso porque, anteriormente, nem sequer eram eleitos; eram nomeados pelos parlamentos nacionais. Mas, no Tratado actual, os deputados são definidos como “representantes dos cidadãos da União”. Numa democracia representativa é fundamental saber quem é o “demos” que é representado. Será que o “demos” da UE é apenas a soma de 27 “demos” dos Estados-Membros ou o actual processo político está a criar um “demos” europeu?
Se não há democracia sem partidos, então também não haverá democracia europeia sem partidos europeus. Talvez que a possível introdução de um círculo eleitoral europeu nas próximas eleições para o PE, em 2014, torne tudo mais claro e então o papel dos partidos europeus, a quem competiria apresentar estas candidaturas e fazer a campanha correspondente, será certamente objecto de maior atenção dos jornalistas e dos eleitores.

Um país da UE duplamente invadido


Publicado em: O Gaiense, 4 de Dezembro de 2010




Escrevo-vos a “carta” desta semana num dos locais politicamente mais complexos da União Europeia: o seu território mais oriental – Chipre – pequena ilha mediterrânica rodeada de Ásia, de África e de Médio Oriente, espécie de contraponto geográfico e geopolítico do nosso muito ocidental e atlântico Portugal. Há algo de muito especial que nos liga aos cipriotas. Em 1974, quando a Revolução dos cravos libertou da censura a nossa televisão e a abriu ao mundo, o primeiro grande evento internacional que pudemos seguir quase em directo foi a guerra em Chipre. República independente há apenas 14 anos, em Julho de 1974 foi alvo de um golpe de estado contra o presidente democraticamente eleito, organizado pela junta militar fascista que governava a Grécia, contando com a cumplicidade de cipriotas gregos de extrema direita. Usando como pretexto este golpe, a Turquia invadiu a ilha. Houve milhares de mortos e de deslocados. A ONU enviou uma força de interposição e criou uma zona tampão ao longo de uma linha divisória que, mais de três décadas depois, continua a ser vigiada por tropas das Nações Unidas, e por militares gregos de um lado e turcos do outro, delimitando a Norte uma zona ocupada, com cerca de 37% do território.

 (Ruas bloqueadas no limite da zona tampão. Ao fundo, o posto de vigilância turco)


Na zona Sul há outros problemas. Quando, após a guerra anti-colonial de 1955 a 1959, os Britânicos finalmente abandonaram o poder e reconheceram a independência de Chipre, decidiram manter duas áreas sob seu controlo, a que chamam “áreas soberanas”, onde têm instaladas bases militares fundamentais para as suas operações no Médio Oriente, no Iraque ou no Afganistão. Nessas zonas, que correspondem a 2,7% do território, não se aplicam as leis do país. Mais curiosamente ainda, apesar de Chipre ser um Estado-Membro da UE e o Reino Unido também, no Tratado de Lisboa voltou a ser reafirmado que “os Tratados não se aplicam nas áreas das Bases Soberanas do Reino Unido de Akrotiri e Dhekelia, em Chipre”. É a diplomacia inglesa no seu melhor. Neste caso, nem foi preciso a Wikileaks revelar o escândalo, basta ler o Jornal Oficial da UE. Mas não se aplicam os Tratados porquê? Porque os ingleses precisam de locais seguros para desenvolver certo tipo de actividades militares e de espionagem que jamais passariam no crivo das leis europeias. Essas zonas ocupadas são verdadeiros offshores constitucionais.

Pobres cipriotas... Quando conseguirem finalmente livrar-se do ocupante turco do Norte, vão ter ainda de tratar do ocupante inglês do Sul.

Rasgar o contrato


Publicado em: O Gaiense, 27 de Novembro de 2010
Um contrato é um acordo com a finalidade de produzir efeitos jurídicos. Fundamenta-se nos princípios da segurança e da comum liberdade de vontade das partes e tem como efeito a criação de obrigações. O Estado português tem, pois, obrigações legais para com os trabalhadores que livremente contratou.
Para além dos contratos de trabalho, o Estado tem firmados outros contratos: de arrendamento de edifícios, de empreitadas de obras públicas, de fornecimentos e de prestação de serviços. Que diriam as partes contratantes se o Estado decidisse unilateralmente reduzir 10% ao valor das rendas que paga aos senhorios dos prédios que ocupa, reduzir 10% ao pagamento das obras que mandou fazer ou reduzir 10% ao pagamento dos bens que comprou aos fornecedores? E que diriam os tribunais se os lesados apresentassem queixa por violação unilateral desses contratos? Alguém duvida da imediata declaração de ilegalidade de uma atitude deste tipo?
Poderá argumentar-se que o Estado não tem dinheiro para cumprir os contratos que estabeleceu com os trabalhadores. Mas, nesse caso, não teria também disponibilidade para cumprir os outros contratos, mas não nos lembramos de ter visto qualquer sinal nesse sentido. Será que os contratos estabelecidos com os funcionários são menos respeitáveis do que os contratos que o Estado estabeleceu com os senhorios, os empreiteiros e os fornecedores?
Dizer que não há possibilidade de cumprir os contratos firmados é uma forma suave de dizer que se está falido. O Estado português está, então, falido? Não está. De facto, há dinheiro suficiente para respeitar os contratos. Pode não haver disponibilidade para novos contratos, para novos investimentos, para novos compromissos, mas nem sequer é isso que transparece da proposta de Orçamento de Estado. Do que se trata é de uma mera escolha política entre várias opções possíveis, cortando numa rubrica orçamental para manter outras onde nem sequer há obrigações legais constituídas.
O lado escolhido para o corte é o elo mais fraco: os trabalhadores. Só será encontrada uma saída decente para as dificuldades actuais quando esse elo mais fraco se consciencializar de que, pelo seu número e pela sua importância na sociedade, pode transformar-se no elo mais forte e pode protagonizar uma mudança a sério nas prioridades nacionais.

Anti-NATO demonstration in Lisbon / Manif em Lisboa

Lisbon, 20th November 2010 / Lisboa, 20 de Novembro de 2010



O pesadelo da paz


Publicado em: O Gaiense, 20 de Novembro de 2010



Em fim-de-semana de cimeira da NATO, sugiro-lhe o pequeno exercício de olhar para a problemática da defesa a partir de um ponto de vista diferente: imagine que era um industrial, um grande industrial dedicado à produção de equipamento militar. Poderiam ser aviões, tanques ou navios de guerra, mísseis ou armamento individual, para o caso não interessa. Como qualquer bom gestor empresarial, o leitor estaria preocupado com a colocação dos seus produtos, com a evolução do mercado, com a manutenção ou, se possível, o aumento da procura; e desenvolveria toda uma estratégia de marketing para incentivar os clientes a investir.
Estou certo de que iria estar muito atento ao decorrer desta cimeira. Em primeiro lugar, porque nela têm assento os seus principais clientes, mas também porque o que nela se vai decidir pode ter um impacto importante no seu negócio. Os norte-americanos são clientes certos, continuam a comprar a um ritmo excelente, mesmo depois do fim da guerra fria e da sua corrida aos armamentos, mesmo depois de os vietnamitas lhes terem mostrado que com guerras não vão lá.
Mas os europeus não são assim tão certos. Há mesmo quem, no meio da crise, dos cortes e da austeridade, se ponha a duvidar da conveniência dos gastos militares. Mas é verdade que os europeus, apesar de se gabarem de que o seu projecto de União conseguiu seis décadas de paz numa parte do mundo dilacerada por guerras sucessivas, acabaram por incluir no Tratado de Lisboa um artigo (42.º) em que “comprometem-se a melhorar progressivamente as suas capacidades militares” e a “reforçar a base industrial e tecnológica do sector da defesa”. Hoje, os 27 gastam mais de 200 mil milhões de euros na defesa, apesar de nenhum europeu de bom senso prever que o seu país venha a ser invadido ou bombardeado num futuro próximo ou longínquo. Mas os americanos insistirão na cimeira para que aumente o contributo europeu para o “esforço comum”.
Se há paz na Europa, se há paz nos dois lados do Atlântico, se não está prevista nenhuma invasão nestes países, a lógica da guerra precisa de um novo conceito estratégico que justifique a intervenção noutras partes do mundo e assim continue a alimentar os interesses insaciáveis da indústria da defesa. A cimeira da NATO assegurará que o negócio continua. Bem haja, dirá o leitor. Parece assim estar afastado o espectro da paz, esse pesadelo horrível em que os negócios da defesa se reduziriam praticamente a zero, levando as indústrias militares à ruína. 

Para além do PIB


Publicado em: O Gaiense, 13 de Novembro de 2010
O Produto Interno Bruto (PIB) é, há 80 anos, o indicador por excelência da actividade macroeconómica, uma referência fundamental para peritos, decisores políticos e comentadores. O PIB soma o consumo público e privado, o investimento e a diferença entre exportações e importações. Os tão polémicos e discutidos limites do défice e da dívida pública medem-se em % do PIB.
Mas, actualmente, são cada vez mais as opiniões muito críticas sobre a adequação do PIB para a avaliação das sociedades, das economias e para a aferição das políticas. Várias ONG e mesmo grandes instituições internacionais, como a ONU, a OCDE e mesmo o Banco Mundial têm sido sensíveis a esses argumentos.
Por exemplo, se o leitor tiver um acidente e mandar reparar o automóvel, isso melhora o PIB. Se o seu carro estiver desafinado e gastar demasiado combustível, se o utilizar quando poderia ir de transporte colectivo, isso também é bom para o PIB, mesmo que contribua para os engarrafamentos e para a poluição atmosférica. O PIB também aumenta se tiver uma fuga de água em casa ou se deixar a luz acesa toda a noite. Isto é, muitas das campanhas promovendo a segurança rodoviária, a poupança de água, a optimização do uso da energia, etc., se tiverem bons resultados, melhoram a sociedade, tornam a economia mais eficiente, mas reduzem o PIB, que nos dirá então que estamos pior. Pelo contrário, a queda de uma ponte, um fogo urbano ou florestal, ou outro desastre ambiental, embora nos deixem pior do que antes, geram actividades de socorro e reparação que contribuem para aumentar o PIB.
Também quando a riqueza se acumula nas mãos de uma parte ínfima da sociedade, com o empobrecimento da maioria, o PIB medirá apenas o total da riqueza e, se esse total crescer, o PIB dirá que estamos melhor, apesar de a mancha de miséria se expandir.
Por isso, muitas propostas têm sido feitas para complementar a medição da produção com indicadores do bem-estar social, da qualidade de vida e do ambiente e mesmo da sustentabilidade desses padrões. Serão apenas instrumentos de medida, mas sem bons indicadores não é possível definir boas políticas. Daí a urgência de olharmos para além do PIB.

O que é que Portugal tem que o Brasil não tem?



Publicado em: O Gaiense
É o fado. Nós temos e o Brasil não tem. Sendo esta uma crónica política e não musical, refiro-me, pois, ao fado na política portuguesa. Em semana de debate do Orçamento de Estado, a grande justificação das medidas que vamos sofrer em 2011 foi que será assim porque tem que ser assim, é uma fatalidade a que não podemos fugir; não há alternativa, é o nosso fado. O problema é que o povo, que em sondagem afirma a sua discordância com as medidas propostas, mostra também que se conforma com os sacrifícios, porque tem que ser. É o espírito do fado a guiar as opções políticas das vítimas do Orçamento, dispondo-as a sofrê-lo com resignação.
Ao mesmo tempo, do outro lado do Atlântico, o fado da resignação perdeu mais uma batalha. Os nossos irmãos, mais dados ao samba, elegeram a nova Presidente Dilma Rousseff. A mulher que disse, no congresso em que foi designada candidata, que “o Brasil avançou tanto nos últimos anos porque soubemos construir novos caminhos, derrubando velhos dogmas. Provamos que distribuindo renda é que se cresce. E se cresce de forma mais rápida e sustentável. Essa distribuição de renda permitiu construir um grande mercado de bens de consumo popular. Ele nos protegeu dos efeitos da crise mundial. Criámos 12 milhões de empregos formais. A renda dos trabalhadores aumentou. O salário mínimo real cresceu como nunca. Estamos construindo um Brasil para todos.”
Para os fatalistas portugueses, este seria o caminho da ruína e da dívida sem fim. Dilma mostra o contrário: “Reduzimos a dívida em relação ao PIB. Hoje não pedimos dinheiro emprestado ao FMI. É o Fundo que nos pede dinheiro.” “Alguns ideólogos chegavam a dizer que quase tudo seria resolvido pelo mercado. O resultado foi desastroso. Aqui, o desastre só não foi maior - como em outros países - porque os brasileiros resistiram e conseguiram impedir a privatização da Petrobrás, do Banco do Brasil, da Caixa Econômica...”
Ninguém pode hoje negar o sucesso económico que resultou das opções políticas dos brasileiros. E os portugueses não precisam de tradução para perceberem o que por lá se passa. Todo o leque de opções políticas de que o Brasil dispõe estão também disponíveis em Portugal, como na generalidade dos países, que a política também se globalizou. O que falta é um povo que saiba apreciar o fado como estilo musical, mas que não faça dele uma estranha forma de vida política, onde a resignação abafa a coragem de construir novos caminhos e derrubar velhos dogmas, como diz a nova presidente.

O Orçamento e os mercados financeiros



Publicado em: O Gaiense, 30 de Outubro de 2010

Houve tempos não muito distantes (todos nos lembramos) em que os Orçamentos de Estado se condicionavam pelo dogma europeu do limite do défice a 3%. Hoje, o défice continua a ser uma obsessão, mas o carácter sacrossanto daquele número passou de moda. Há um outro espectro que projecta a sua sombra sobre os Orçamentos de Estado de uma forma ainda mais impositiva: a opinião e as reacções dos mercados financeiros. Se os salários e as despesas sociais não baixarem, os mercados financeiros zangam-se. Se os partidos não se entenderem, os mercados financeiros aumentam a nossa taxa de juro. Quem nos faz imposições já não é só Bruxelas que, apesar do que muitas vezes se diz, ainda tem um rosto, ou vários rostos, que podemos conhecer, criticar, atacar. Quem condiciona as decisões que hoje estão a ser tomadas em Portugal (e noutros países) são os mercados financeiros, essas vagas entidades implacáveis e sem rosto, que estariam por isso ao abrigo de qualquer crítica. Os governantes e os seus parceiros da oposição nem gostam, nem deixam de gostar dos mercados financeiros; reconhecem-nos simplesmente como a condicionante suprema da sua acção política. É a aceitação de facto de que, para além da independência económica, acabamos de perder também a independência política. O argumento chave desta lógica perversa é só um: a inevitabilidade.
Os mercados, quando prevêm que o futuro das nossas finanças pode ser problemático, aumentam a taxa de juro da dívida pública, ajudando com isso a que as suas próprias previsões se confirmem. Simultaneamente, o Banco Central Europeu - organismo público - continua a emprestar ao sector financeiro privado à mesma taxa de juro de referência de 1%, mas os Estados - organismos públicos - têm de se financiar nos mercados financeiros privados a 4, 6 ou 7%. Para quem paga, isto é um claro absurdo. Para quem cobra, é um negócio fácil e altamente rentável.
O resultado é uma gigantesca transferência de fundos das populações dos diferentes Estados para os detentores do capital, aquela gente muito concreta, mas sem rosto, a cujos investimentos chamamos mercados financeiros e que, no fundo, nos está a emprestar a taxas proibitivas o nosso próprio dinheiro, aquele que nos sacou anteriormente, ao longo dos anos em que tem durado este processo de extorsão.

Eurodeputadas do Bloco e do PCP coordenam conferência contra a NATO


"Pela Paz no Mundo. Contra a NATO e a militarização da UE"
Conferência em Lisboa, 29 de Outubro de 2010
(Local: Casa do Alentejo - Rua das Portas de Santo Antão 58)
Entrada livre

Programa
Coordenação dos três painéis:
Marisa Matias (Bloco de Esquerda) e Ilda Figueiredo (Partido Comunista Português)

10:30 - 12:30 Primeiro Painel

Intervenção de abertura por Lothar Bisky, presidente do Grupo da Esquerda Unitária Europeia / Esquerda Verde Nórdica (GUE/NGL)
Intervenções de outros eurodeputados e antigos eurodeputados:
Willy Meyer (Esquerda Unida - Espanha), Sabine Lösing (A Esquerda - Alemanha), Tobias Pflüger (ex-deputado - A Esquerda - Alemanha).
Outros eurodeputados participantes: Charalampos Angourakis (Partido Comunista Grego) e João Ferreira (Partido Comunista Português).
Debate

14:00 - 15:30 Segundo Painel

Intervenções de:
Rui Namorado Rosa, professor
Pedro Pezarat Correia, general, especialista em assuntos militares
Debate

16:00 - 17:30 Terceiro Painel

Intervenções de:
- PAGAN - Plataforma anti-guerra. anti-NATO.
- Campanha em defesa da Paz e contra a cimeira da NATO em Portugal: "Paz Sim! NATO Não!"
Intervenção de representantes da CGTP-IN, CPPC, UMAR, MDM.
Debate

Conclusões por Ilda Figueiredo e Marisa Matias



Os donos da Europa falaram


Publicado em: O Gaiense, 23 de Outubro de 2010

A França e a Alemanha assinaram esta semana, em Deauville, uma declaração sobre o governo económico da UE que é uma verdadeira proposta de certidão de óbito do princípio de igualdade dos Estados-Membros adoptado nos Tratados e uma declaração de guerra à autonomia política e aos direitos soberanos em matéria orçamental.

Merkel e Sarkozy consideram que, para levar a cabo as suas propostas, será necessário alterar o Tratado de Lisboa, que entrou em vigor há menos de onze meses, no meio de grandes e entusiasmados festejos. É verdade que mereceu severas críticas por parte de várias forças políticas da oposição, mas foi apresentado pelos seus autores e defensores como a grande solução para o bom funcionamento da UE, após anos de difíceis negociações e peripécias, que incluíram a rejeição em referendo do projecto original.

O facto de os líderes da França e da Alemanha afirmarem, com toda a naturalidade, que o Presidente do Conselho Europeu deve apresentar uma proposta de alteração do Tratado até Março de 2011 e de estabelecerem mesmo os termos e limites dessa proposta, revela uma intolerável arrogância e uma postura de poder absoluto sobre os restantes países e governos europeus.

E para que querem eles mudar o Tratado? Para ampliar o leque de sanções e para abrir a possibilidade de, para além das sanções correctivas, poderem aplicar sanções preventivas aos países cuja consolidação orçamental lhes pareça desviar-se do previsto no Pacto de Estabilidade e Crescimento. Acontece que não há sanções preventivas no Tratado de Lisboa, nem provavelmente em nenhum ordenamento jurídico de qualquer país civilizado.

Querem também introduzir a participação institucional dos credores privados dos Estados e suspender os direitos de voto dos governos dos países que apresentem violações dos princípios básicos da União Económica e Monetária.

Depois de tentarem impor o visto prévio aos Orçamentos de Estado que são votados nos Parlamentos nacionais, pretendem agora reforçar a sua tutela permanente sobre os países mais pequenos.

Haverá na Europa coragem suficiente para colocar esta gente no seu lugar?

A França que se defende na rua e nas greves


A França continua na rua e em greves em defesa dos seus direitos, ou do que resta deles.

Segundo uma sondagem (CSA/Le Parisien/Aujourd'hui) publicada nesta segunda-feira, 71% dos franceses encaram positivamente a realização das manifestações contra os planos do governo, nomeadamente no que se refere às reformas.
Sondagens sucessivas têm atestado o crescendo do apoio popular às acções contra os planos de austeridade, que deixaram de ser vistas como meramente sindicais, para se tornarem numa verdadeira causa nacional.

Aqui ficam algumas imagens.


Uma vasta frente sindical encabeça as manifestações.


A participação espectacular do Théâtre du Soleil,


que apresentou uma Justiça ferida...

atacada por agoirentas aves negras.

Nas suas mensagens, o Théâtre du Soleil convocou Ésquilo, Shakespeare,
J. J. Rousseau, Victor Hugo, Benjamin Constant e Romain Rolland.



Nesta faixa pode ler-se: 
"Quando a Ordem é Injustiça, a Desordem é já um começo de Justiça".
Magnífica citação de Romain Roland, extraída do seu livro
"Le Quatorze Juillet", um texto para teatro publicado em 1902.


Veja o vídeo aqui

Esta é não só uma luta pelo trabalho, mas também uma luta
para que haja mais vida para além do trabalho,
todas as semanas e também no tempo de reforma.