Terrorismo cristão?


Publicado em: O Gaiense, 30 de Julho de 2011
Confesso que esta expressão - terrorismo cristão - não deixa de me provocar um estranho incómodo. Eu sei que o que se passou no centro de Oslo e na ilha Utoya é puro terrorismo e também que o seu autor se apresenta como um fundamentalista cristão de direita, apreciador das cruzadas, um cavaleiro templário dos tempos modernos que quer salvar a Europa do marxismo cultural e da islamização.
Mas todos nós, cristãos, ateus, agnósticos, de outras religiões ou apenas indiferentes, que vivemos neste país dito de tradições cristãs, sabemos bem que este terrorismo, feito em nome da pureza cristã da Europa, de cristão nada tem. Daí o incómodo que sentimos com a expressão. Isso deveria ajudar-nos a entender que é talvez semelhante o incómodo que sentem os habitantes de países de tradição islâmica quando se fala tão insistentemente de terrorismo islâmico. Considerarão, como nós, que esse terrorismo de islâmico nada tem. Mas, lamentavelmente, continuamos a referi-lo como tal.
É certo que os terroristas se justificam com o cristianismo e com o islamismo para as suas acções. Mas assumirmos os seus argumentos não ajuda ao combate contra o fenómeno. Como também não ajuda considerarmos que se trata apenas de loucos isolados que na sua demência executam planos que vão para além da compreensão humana. De um lado e de outro há caldos de cultura de um ódio que se alimenta de problemas muito reais. A tolerância ou a neglicência no combate a essas ideologias, mesmo quando apresentam uma face mais civilizada, e a falta de solução dos problemas sociais que lhes permitem crescer, são os dois factores principais que abrem caminho para o desastre. Se não eliminarmos hoje o ovo da serpente, teremos amanhã de nos confrontar com ela. E a Europa tem obrigação de saber os custos terríveis que isso tem.

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